sábado, 21 de agosto de 2021

Reflexões sobre a Importância da Inocência

 

A Inocência é a Neutralidade ou é o Bem? 

O ser humano quando nasce é uma "tábula rasa"? É completamente neutro ou o bem e o mal existem desde o nascimento? Existem desde antes? Estes conceitos permaneceram debatidos apenas em círculos religiosos/ espiritualistas, pois foram praticamente abandonados pela filosofia em algum período entre a renascença e o iluminismo. Talvez este abandono por parte da filosofia tenha ajudado a ciência se livrar dos tabus e tradicionalismos das religiões, mas deixou algumas lacunas... 

Como a filosofia (e consequentemente a ciência) abandonou tal debate, ainda não sabemos as "origens do bem e do mal", mas no senso comum em geral, as crianças são vistas como puras / inocentes no início de suas vidas. Afinal o adulto que pensa que uma criança de 1 ou 2 anos de idade é maliciosa ou algo do tipo, é no mínimo paranoico... Pode ser que a criança herde alguns traços de personalidade, mas não abordarei tal assunto aqui, pois a criança tem um longo período de oportunidades para ter seus aspectos sentimentais e racionais "moldados" pelos adultos que a cria. 

Para quem gosta de psicanálise e acha que sexualidade infantil é uma virilidade que surge na criança, sugiro que pare de criar tais fantasias. E para quem tem pavor da psicanálise por considerá-la atribuir uma perversidade à toda criança, sugiro estudar um bocadinho. Sexualidade infantil nada mais é do que um termo polêmico referente aos fatores biológicos como instintos de sobrevivência e o desenvolvimento de zonas erógenas do corpo. Talvez haja alguns exageros ou vieses nestes argumentos psicanalíticos, mas nada digno de idolatria ou de rancor histérico. 

Voltando aos aspectos mais internos da mente humana: A "pureza", um possível sinônimo de inocência neste caso, é íntima da receptividade (estar aberto à): A criança geralmente perde esta pureza em determinado(s) momento(s) ao interagir com os adultos e suas ganâncias e orgulhos, mas pode restaurá-la buscando a humildade. Humildade esta que é a expressão da receptividade ou o esforço bem sucedido em ser receptivo, um quesito básico para evoluir racionalmente (pela ciência por exemplo) e sentimentalmente (espiritualmente ou religiosamente). 

 Como pode ser observado em qualquer forma de vida onde algum progenitor cuida de sua prole, os filhotes não precisam se sustentar. Os "pais" se esforçam em fornecer sustento e segurança aos filhos, embora existam algumas exceções a esta regra. Este é o comportamento dominante que garante perpetuação das espécies de aves e mamíferos. Assim, a grosso modo, na infância do ser humano é possível alcançar a felicidade mais facilmente do que durante a vida adulta. Resumidamente esta felicidade é oriunda dos afetos positivos. 

Enumerar afetos é uma tarefa difícil, pois estamos falando de sentimentos, mas tentarei agrupá-los, ou ao menos, classificar alguns parâmetros: 

O "primeiro afeto" viria da relação onde o adulto que cuida da criança com sua inocência (próxima de uma receptividade natural, e portanto próxima da humildade também) em seus estágios iniciais de vida. Estes estágios não são fixos, podem variar, mas é basicamente o período em que os pequeninos estão formando seus sentimentos em relação a quem cuida deles e ao seu pequeno e novo mundo exterior; 

A troca de bons sentimentos e o ter alguém para gostar (amor) seria um exemplo básico de afeto importante no desenvolvimento do ser humano, ainda que existam muitas distorções sobre os significados do amor, feitas essencialmente por adultos que cresceram com déficits afetivos. Este amor se dá com quem a criança cresce e se desenvolve - os pais, familiares e novos amigos que são realmente presentes. Importante destacar a presença, seja na forma de uma persistente companhia agradável, fiel ou ambas; Por fim a esperança da criança seria o último afeto positivo ou talvez um grupo ou parâmetro de afeto. Conforme a criança ou adolescente em desenvolvimento recebe respostas construtivas, ou "transformadoras-não-destrutivas", seja no aspecto mental (ensino de convívio e talvez de artes e trabalho) ou físico (quando os "pais" cuidam da saúde deste), ele desenvolve características como inspiração e esperança. Talvez isto conclua um ciclo de segurança útil para que a criança não cresça achando que tudo pode acabar a qualquer momento e nada realmente importe... Não se trata de crescer com uma fantasia e sim de crescer entendendo possibilidades. Assim ela cresce com empatia e com ao menos alguns dos sentimentos como respeito, alegria, esperança e tantos outros tidos como muito subjetivos ou fúteis por pessoas mais insensíveis. Pessoas que desprezam tais sentimentos podem ser problemáticas de várias maneiras: podem ter recebido uma educação fria, podem sofrer de alguma psicopatologia etc... 

Observações sobre a Infância 

 Tive a oportunidade de fazer observações sobre como três famílias cuidavam de suas respectivas crianças por alguns anos. Acompanhei todos os casos sem interação direta, mas "de perto" e não por opção, mas por conviver durante anos quase que em período integral com tais vizinhos em um prédio com abafamento/ isolamento sonoro quase nulo (e portanto com pouca privacidade): 

O 1º caso foi de uma menina cuja os pais demonstravam pouco afeto por ela. Ouvi quase que diariamente a rotina desta família por 5 ou 6 anos.

O pai queria ter um menino, quando a filha nasceu deixou-a com a mãe que havia parado de trabalhar. Só percebi que o pai passou a interagir mais com a menina, quando esta já tinha 3 anos de idade. 

A mãe mostrou-se uma pessoa sem paciência com crianças. Várias cenas no mínimo peculiares ocorreram: 

A primeira frase que ouvi a criança dizer foi "Vô ti matá". Uma imitação do que a mãe dela falava frequentemente com irritação (Vou te matar); 

A mãe quase que diariamente gritava, muitas vezes ordenando a filha a atender o telefone. A criança tinha no máximo 2 anos de idade quando isso começou; Ainda nesta fase, a mãe exclamou diversas frases que demonstravam impaciência com a filha, como esta: "Ai fulana, como você é criançona!!" 

Enfim, quando a filha estava com cerca de 6 anos de idade, ela era tida como muito independente pelos familiares e visitas... 

A história se repetiu de maneira similar com mais dois "vizinhos": 

Uma mulher que se irritava com a infantilidade de seu filho de 4 anos de idade e que mostrava indignação pelo fato da criança ainda não saber tomar banho sozinha nem se vestir corretamente... Neste caso, o pai dedicava um tempo aparentemente significante para brincar com filho, mas parecia "workalcholic": Trabalhava segunda à sábado em sua própria empresa, em média das 7hs às 19hs e frequentemente fazia "horas extras" seja nos dias de semana durante à noite ou, mais raramente, aos domingos durante o dia. Sua relação com a esposa se mostrava mais fria do que afetuosa. 

Outra mãe que gritava o tempo todo com a filha de 3 a 4 anos de idade e regulamente ridicularizava a infantilidade da mesma. Ambas (mãe e filha) passavam período integral na empresa na qual o marido era proprietário ou sócio-proprietário. O pai, dono de empresa, se gabava diante os funcionários regularmente, gostando de fazer piada e pregar peças nos mesmos (geralmente gritava para assustá-los). A criança começou a imitar os pais, gritando frequentemente (como o pai) e mostrando claras expressões de impaciência (como a mãe). 

Estes dois últimos casos, pude observar por cerca de 3 anos, diariamente em período integral (devido a meu home office e as características do prédio já mencionadas) 

São todos casos, onde os pais predominantemente desprezam a inocência e a ingenuidade da criança, ridicularizando-a e não tendo paciência para ensinar nem para dar afeto positivo. Obviamente não se trata de algo como vilões torturando crianças, mas efetivamente tal criação têm seus traços de tortura. Explico: 

É público e notório que a criança em suas fases iniciais da vida, precise de amparo. Ela não sabe se alimentar, nem se vestir, nem fazer necessidades fisiológicas como os adultos fazem convivendo em sociedade. Todos aprendizados e afetos necessários vem dos pais. Se os pais repetem os comportamentos de impaciência ou de aversão às necessidades dos filhos, obviamente haverão consequências na formação psíquica (vulgarmente e erroneamente chamada de psicológica) destas crianças. 

 Os casos que eu citei têm vagas semelhanças com outros dos quais recebi relatos. Na verdade alguns desses casos que ouvi, incluíam abandono e violência, ou seja, geraram consequências provavelmente mais severas na formação psíquica dos filhos. Enfim, não é difícil notar que no lugar de afetos positivos, muitas vezes, essas crianças não obtiveram respostas dos pais, ou no caso de violência, recebia afetos negativos, sem compreender a situação. Aí estão (algumas) prováveis causas de vazios afetivos e, no caso, da criação violenta, pode até mesmo ocorrer psicopatologias ou "perversão" (aqui usada como gosto pela violência)... Pessoas que cresceram com estes déficits, possivelmente não entenderão muito bem os sentimentos, e terão grandes dificuldades em aprendê-los depois de adultos. 

Perda da Pureza 

O senso comum diz que crianças são meramente ingênuas ou crédulas. Podem até ser crédulas, mas o fato é que a pureza além de conter semelhanças ou certas quantias de receptividade e humildade, é uma ausência do preconceito. Muito do que os adultos pensam que é amadurecimento (no senso comum) é só preconceito, isso quando não é o caso de tabus. 

Os exemplos são muitos: Se vestir bem (roupas caras na maioria das vezes), ter carro próprio, ter salário alto, ter vida sexual hiperativa, mostrar conhecimento mesmo quando não se tem (nunca assumir erros), delimitar sentimentos para homens e para mulheres, permitir emoções só em determinadas situações (em torcidas, em certas rodas de conversa) etc... Embora alguns desses artifícios possam ter surgido em certos grupos de pessoas para contornar determinadas situações de dificuldade, a maioria não tem utilidade real, tanto que jamais alguma destas coisas poderia ser transformada em lei em qualquer sociedade minimamente desenvolvida neste século 21. Tabus e preconceitos são comportamentos mesquinhos e falsos, utilizados para poucos indivíduos adquirirem uma satisfação particular geralmente prejudicando uma outra pessoa ou prejudicando um grupo de pessoas. Muitos deles se apoiam em rivalidade e portanto em orgulho também, no sentido narcisista da palavra mesmo. 

Deveria ser desnecessário falar o quão rivalidade e orgulho são mais nocivos do que benéficos para todas as pessoas de qualquer sociedade... Mas ainda é necessário repetir este argumento. E muito, pois todas estas idiotices se manifestam em variados assuntos e em diferentes intensidades. E como incentivos a rivalidade e ao orgulho/ egoísmo, tais tabus e preconceitos são ataques à humildade e a receptividade, características tão interligadas à pureza natural na infância. 

A própria presunção da inocência no sistema judiciário e a ausência de pressupostos em métodos de estudo, requerem muito destas características que constituem a pureza mencionada há pouco. 

Conclui-se que a chave para o bom funcionamento de setores essenciais para ordem (o direito, o judiciário etc) e para o progresso (a ciência) de qualquer nação está debaixo do nariz de toda a espécie humana: Toda criança nasce com tais características... O problema é que elas são destruídas ou substituídas por tabus, preconceitos e outros comportamentos nocivos à sociedade em geral.

domingo, 15 de agosto de 2021

As Farsas contra a Empatia e o Bem-estar social


Este texto traz um resumo histórico de ideologias segregadoras que se alastraram da religião à economia ocidental e seus efeitos nocivos ao desenvolvimento dos sentimentos (empatia por exemplo) e ao bem-estar social. 

Conforme o empirismo britânico e o materialismo foram se propagando entre as classes intelectuais durante o iluminismo, passando pelas tentativas de segmentação entre filosofia e ciência, certo campo foi majoritariamente deixado em segundo plano: Os sentimentos. 

É compreensível em partes, pois apesar de sua importância (citada neste texto, por exemplo: https://amorpelosabersaberamar.blogspot.com/2023/12/para-preencher-o-vazio.html), os sentimentos são, ou deveriam ser, estudados basicamente pela psicologia. Desculpas para relegá-los ao um segundo plano, são inúmeras: Sua subjetividade, uma suposta insignificância diante outras áreas do saber, suas particularidades etc. 

Neste longo processo de desenvolvimento e de cisões, a ciência (portanto uma parte significante dos psicólogos), afastou-se destes 3 temas: religião, filosofia e sentimento. Obviamente isto foi muito útil para alguns campos da ciência que precisaram da diminuição de interferências feitas por religiões e ideologias. Porém não é o caso da psicologia, ao menos, não mais. Desde a segunda metade do século 19, bases de estudo para psicologia vêm sendo criadas. São as bases teóricas, ou seja, estruturas que servem de parâmetro para estudar e tratar pacientes e clientes da psicologia. Estas estruturas são essencialmente baseadas em métodos científicos. Porém esta escolha por métodos para formar uma base gerou segmentações profundas na psicologia: Não se trata de especializações, nem de diferentes campos de atuação, são três frentes teóricas: Comportamental, Psicanalítica e Fenomenológica. 

Independentemente da frente, o sentimento passou a ganhar notável relevância nas abordagens psicológicas em meados do século 20, talvez mostrando uma relação com os movimentos sociais contra o conservadorismo e contra o consumismo durante os anos 60 (movimento hippie, amor livre, protestos antirracistas etc). A partir daí fica mais notória a importância e a possibilidade de tratar sofrimentos psíquicos antes que se tornem mais graves. Estes casos mais graves são considerados psicopatologias (doenças mentais) por muitas das "abordagens" da psicologia. Sim, epidemias de ansiedade e depressão geralmente têm origem em sofrimentos psíquicos, muitas vezes causadas por relações familiares/ sociais conturbadas ou difíceis, afinal é bem improvável que a maioria da população humana mundial tenha nascido com problemas de origem neurológica. Esta é uma prova óbvia (mas negada por muitos) da importância dos sentimentos na saúde mental humana. 

O ser humano é capaz de desenvolver e adquirir tanto conteúdo racional como conteúdo sentimental. A partir do ponto em que nota-se a necessidade de sentimento e o potencial de adquirir conteúdos racionais e sentimentais é possível entender o quanto os vazios afetivos e os sentimentos negativos podem ser perigosos (cada um a sua maneira/ velocidade, é verdade): 

Relacionar-se requer alguma abertura (falar de si, dar atenção ao outro...) e alguma coragem. Quando não há relação com o novo, ou quando alguém se dispõe a alguém insensível / oportunista, resumidamente cria-se um sentimento de tristeza ou um vazio. Daí lideranças interesseiras podem preencher estes vazios com sentimentos negativos, como por exemplo incitando o orgulho nas pessoas de um determinado grupo: Pode ser uma igreja, ou uma religião inteira; Um clube de motociclistas, de "gamers", de fãs de determinado estilo musical ou tantos outros grupos com algo em comum. Incita-se ao ódio aos estranhos ou aos desconhecidos, basicamente de outros grupos. Basta colocar a culpa de determinados problemas, sejam sociais ou econômicos neste estranho, então está criado o vilão. 

Não basta estudo racional para evitar tal tipo de manipulação. A necessidade de sentimento é uma verdade óbvia e superior a qualquer argumento superficial que tente diminuí-la. 

Os Movimentos de Manipulação 

O conservadorismo e o consumismo vieram como proposta para "distrair/ ocupar" as pessoas. Obviamente eles foram utilizados por lideranças de alguns setores da sociedade, mas deixemos para abordar tais lideranças em outra ocasião. 

O sufixo "ismo" indica centralidade, ou seja, dar maior importância, por isto, muitas vezes indica uma doutrina, ou um sistema centrado em tal tema. 

Assim, vejamos primeiramente o conservadorismo: Trata-se de uma doutrina onde conservar é mais importante do que tudo. Conservar o que? Conservar sem definir um alvo, é conservar as coisas em geral como estão, negando novidades e descobertas. Sendo assim, as ideologias conservadoras se referem a defender tradições, ritos e costumes antigos. Esta defesa do antigo e da estagnação acaba negando possíveis descobertas e novidades (daí o negacionismo). E como mencionei em outro texto, quanto mais antigo, mais as coisas pareciam misteriosas, afinal pouco conhecimento havia sido construído pelas sociedades humanas. Frequentemente as pessoas com menos conhecimento precisavam entender os fatos e a natureza ao seu redor, então recorriam às pessoas que conheciam tais assuntos. Acontece que eventualmente, alguns destes que sabiam eram interesseiros e acabaram manipulando aqueles indivíduos com menos conhecimentos. Isto se repetiu "X" vezes na história, atingindo seu ápice no campo religioso. Portanto, conservadores muitas vezes são religiosos com medo da ciência e medo do desconhecido. Medo esse que facilmente se transforma em ódio, ou seja, é claro que em algum momento a persistência no conservadorismo gera misoneísmo (medo ao novo/ ódio ao novo) e às vezes, é um mero sinônimo deste último. 

Um medo em menor escala, geralmente é chamado de receio e está ligado ao "ato" de hesitar. Nesta pequena quantidade, ele pode até ser saudável quando nos protege de um perigo. Porém o medo em si, é essencialmente paralisante, e portanto, estagnante: Impede ou atrasa descobertas e progresso. 

Já o ódio (incluindo os discursos de ódio) vai contra tolerância e piedade. Tolerância e piedade já são positivos por si, permitindo abertura ao diálogo e às relações. Além disto, quando mútuos, ou seja, de ambos os lados de uma relação interpessoal ou inter social, são evidentemente saudáveis para todos. Eles não são estagnantes como o medo, pois a curiosidade existe independentemente do ódio e da piedade. Por fim, a tolerância e a piedade podem mostrar-se como manifestações de um amor expansivo, enquanto o ódio é o querer mal, é o desejo de vingança, de atormentar ou de destruir algo, alguém ou algum grupo. Como todo ser humano tem necessidade de sentimento, líderes interesseiros, pessoas mais influentes, conseguem manipular facilmente estas coisas. 

Seguindo esta linha, o consumismo é a doutrina do consumir: Comprar, gastar em primeiro lugar, menosprezando a consciência e o cuidado com o ambiente e com a sociedade. É o ato de "criar necessidades" e obviamente essa criação não é da natureza (para ateus e céticos) nem de Deus (para religiosos e afins). Esta criação de necessidades é realizada por quem tem marcas/ empresas que vendem produtos. É invenção de quem tem dinheiro para campanhas publicitárias e propagandas e quer lucro, ou seja, mais dinheiro, fortuna. Alguém poderia falar, ah mas o consumo move o mercado, distribuindo riqueza. Não, consumismo é a CENTRALIDADE NO CONSUMO: Consumir como se não houvesse amanhã, sem pensar, deixando todo o resto em segundo plano. Isto gera descaso com o meio-ambiente e com o destino dos resíduos dos produtos, portanto, causa a poluição descontrolada de rios, matas, oceanos, da atmosfera etc. 

Para propagar essa necessidade artificial de consumo, obviamente houve necessidade do aumento da produção de bens comercializáveis dentro do sistema predominantemente capitalista (produção e consumo para lucros em primeiro lugar, é claro). Nas empresas de diversos segmentos então, espalhou-se a ideia de produzir cada vez mais, relegando o bem estar social, a qualidade de vida e o meio ambiente como assuntos secundários. O discurso que prega a importância da produtividade e do mérito então, obviamente foi propagado nas empresas e além delas, como nos meios de comunicação em massa e posteriormente nas redes sociais. Assim fica nítido que a necessidade de consumir criada artificialmente está relacionada à doenças psicopatológicas como depressão e ansiedade, ao desperdício, ao câncer causado por agrotóxicos, ao aquecimento global etc. 

Conclui-se então, que conservadorismo e consumismo são distrações que obviamente servem a certos poderes da sociedade como as religiões institucionalizadas e as corporações continuamente interessadas em lucros crescentes. 

A diferença é que o primeiro explora a necessidade afetiva/ sentimental dos seres humanos, manipulando sentimentos para dizer que está tudo bem, que a culpa dos problemas está no desconhecido, no diferente. 

O segundo (consumismo) prega um materialismo escrachado, baseado nas seguintes mentiras maliciosas: 

sucesso é adquirir produtos (das propagandas) ou acumular capital; 

ocorre uma seleção "natural" e "não induzida", do mais forte na civilização urbanizada; 

estes mais "fortes" da civilização são os mais ricos (multimilionários); 

Estes multimilionários chegaram ali por esforço próprio ("mérito") 

Ou seja, o mais adaptado a um sistema dinheiro "cêntrico" (capitalista) e ao governo daqueles que enriqueceram mais por usarem sua "inteligência ou esforço" (meritocrata, plutocrata), são os sujeitos ideais, os "bem-sucedidos". Sim, o consumismo se apoia na ideologia capitalista e fomenta o discurso meritocrático. Tais ideologias e discursos são menos úteis do que fezes, considerando que esta última, popularizada com o nome de bosta, ao menos serve de adubo, colaborando com o plantio etc. Assim, pode-se concluir que na natureza e nas civilizações, o consumo de bens materiais, obviamente é menos importante do que o desenvolvimento racional (da cognição à reflexão) e que o desenvolvimento do sentir (inclui desde intuição até os sentimentos). Este desenvolvimento nos permite entender o meio, seja ele ambiental ou social. 

Ascetas - Fanáticos Espiritualistas? 

Anti consumistas existem há milênios e os ascetas são alguns deles.

Mas o que é um asceta? 

Um eremita que não faz sexo e frequentemente jejua? 

Um magrelo que senta ou deita numa tábua cheia de pregos? 

Um cara que medita o dia todo e levita? 

Nada disso. A palavra asceta vem do grego e significa alguém que exercita o espiritual. Pode-se concluir a partir da etimologia desta palavra e da história da Grécia, que ascetas eram pessoas que praticavam atividades relativas ao espírito, ou que se dedicavam ao aperfeiçoamento de seus espíritos (ou de suas almas, não faz muita diferença). Historicamente é aceito que os discípulos de Pitágoras (pitagóricos) eram filósofos, cientistas e ascetas. Sim, cientistas dentro das possibilidades de sua época na Grécia clássica e também religiosos devotos (ascetas). Neste sentido esta combinação não difere muito dos ensinamentos de Sócrates e Platão. 

Devoção não significa fanatismo, muito menos intolerância ao diferente, mas exige moderação entre várias atividades. Esta moderação servia para o asceta poder dedicar bastante de seu tempo com suas atividades essenciais, pois a filosofia (a amizade com o saber) era não só a filosofia como é conhecida hoje, mas era ciência e religião também. A partir daí a moderação era, e ainda é, mal vista por pessoas acostumadas (ou até viciadas) com os diversos luxos: Sejam banquetes, festas, orgias, ou bens materiais tidos como preciosos. 

Alguém poderia falar: Oras, eles (os pitagóricos e socráticos) eram uns cientistas de araque porque eram religiosos! 

Será? Há uma prova empírica disto? Certamente não. A revolução feita por esses e alguns outros filósofos da Grécia Clássica foi praticamente única: Em seu tempo a civilização grega fez vários avanços notáveis nas ciências e deixou de ser composta por ligas de cidades-estado, tornando-se um império. A esfericidade da Terra por exemplo, foi teorizada por Pitágoras (570 aC - 490 aC), aceita por Sócrates e por Platão, calculada por Erastótenes (276 aC - 194 aC) e difundida até o tempo de Crates de Mallus (~220 aC - 140 aC). 

Ah, mas o que acabou com o império greco-macedônico não foi a religião? Não. Foi a ganância, em grande parte, de líderes militares que, desejando mais terras e riquezas, atacaram uns aos outros em batalhas sangrentas e acabaram dividindo o império. 

E o conhecimento parou de se propagar, possivelmente com a expansão do Império Romano após a conquista de regiões de cultura grega, como Pérgamo. 

Com a decadência do Império Romano, muitos destes conhecimentos ficariam restritos à igreja católica (e/ou ao Califado Rashidah/ Omíada), que consolidaria seu poder durante e após a queda do império. Porém, a filosofia de muitos destes autores "gregos clássicos" sobreviveu nos impérios árabes e só retornaram à Europa após o período da construção das primeiras universidades e das primeiras cruzadas durante o século 12. 

Materialistas são realistas? 

Mais uma vez devo lembrar que o sufixo ismo refere-se a uma centralidade ou a uma doutrina (baseada no termo anterior ao sufixo). 

Até mesmo admitir a matéria como centro de todos assuntos ou de uma doutrina tem sua subjetividade, afinal o que é matéria? Todos elementos encontrados nos 3 ou 4 estados - sólido, líquido, gasoso e plasmático? Do que é feita a matéria? Átomos? Prótons, nêutrons e elétrons? Os prótons são constituídos de quarks, mas quarks são sub-partículas? Porque não são partículas? Os elétrons estão em movimento ou parados? Há estudos que indicam que não estejam em nenhuma destas condições conhecidas... Ou seja, materialismo é um conceito simplista e possivelmente obsoleto. Esta observação não se trata de desprezar as ciências exatas ou o método empírico e sim de começar a dar a devida atenção para certos campos como, por exemplo, para a física teórica e para as teorias da psicologia fenomenológica e psicanalítica. 

Atacar ou menosprezar modelos mais teóricos, seja das ciências exatas ou das humanas serve a alguém. Toda ação tem um porque e uma finalidade. Crer que o acaso gere algo, é tolice, o próprio prefixo da palavra acaso é uma negação, portanto acaso significa "não-caso" ou sem causa. O não ou o nada não podem ser provados por método de estudo algum. Prova-se o que existe, seja fácil ou difícil de descobrir... Inclusive os termos corretos deveriam ser encoberto e descoberto. 

Os ataques aos modelos mais teóricos (os que conheço melhor são da psicologia e não da física) então têm a finalidade de impedi-los, portanto possuem objetivo de estagnação ou encobrimento dos estudos, teorias etc. Este é um comportamento comum de quem está confortável, ou por cima de uma situação. Como mencionei em outros textos, esta é uma tática usada por lideranças religiosas, econômicas, políticas e militares… Mas sabemos que na civilização humana, a classe científica/ acadêmica não está no topo. Este topo refere-se a quem tem mais recursos e obviamente é ocupado pelos mais milionários, que em geral são "mega empresários". E sim, os indivíduos que compõem esta classe, são extremamente materialistas. Acumular recursos que sustentariam milhares de famílias por décadas, enquanto milhões de pessoas passam fome pelo planeta é uma prova disto. 

Além do materialismo, é sempre bom lembrar o nível da ganância, que nada mais é do que parte da ideologia capitalista. Se há provas disto? Sim, há: 

Uma prova é os empresários mais ricos fazerem lobby em busca de mais benefícios próprios enquanto a humanidade passa por uma situação de desigualdade e miséria. Outra prova é poluir ou destruir biomas do planeta em busca de mais benefícios próprios. Outra prova é evitar pagar imposto em busca de mais benefícios próprios, enquanto pessoas com renda 100 ou 1000 vezes inferior pagam seus impostos…  Enfim, não faltam provas que a ganância é uma (ou a) força motriz do capitalismo. Esta ganância nociva a maior parte da civilização é também prova de que os indivíduos que constituem o topo da "cadeia socioeconômica" da Terra possuem psicopatologias. Isto de maneira alguma fazem deles vítimas, pois as ações de tais indivíduos afetam milhares ou até milhões de pessoas, seja em um país ou no mundo todo. 

Parece até um conto mitológico ou de fantasia, mas não é impossível descobrir alguns destes indivíduos: Em mídias de direita (de teor capitalista, neoliberal, como a Forbes) eles ocasionalmente aparecem como bons exemplos, praticamente ídolos. Já em mídias de esquerda (seja social democrata ou até de ideais comunistas), eles são geralmente expostos, por seus crimes e ações mesquinhas. Ações que certamente provam que são psicopatas ou sociopatas. 

 Troca de Poderes na História Ocidental 

Esta classe que ocupa o topo da cadeia socioeconômica não é novidade. Ela foi se formando a partir de burgueses europeus que foram adquirindo direitos gradualmente a partir da idade média baixa (no século 14, quando ocorreram grandes conflitos entre ordens religiosas e aristocracias). Naquela época as coisas até pareciam equilibradas, já que eles concorriam com outras poderosas classes - a aristocracia e o alto clero. Além disto, tais classes "burguesas" não têm uma raiz única: muitos grupos foram se juntando a eles, como calvinistas, companhias privadas de navegação etc. 

No século 15 acabam as tentativas de conciliação entre a igreja católica romana e a ortodoxa na Europa. Dos concílios restaram apenas as discussões filosóficas das universidades, que, somado a chegada e transformação da imprensa na Europa, fomentou a "renascença" deste continente. Mas como nem tudo é um mar de rosas, o Império Otomano dificultou o acesso das potências europeias aos produtos orientais (da Ásia). Eis que alguns países europeus passam a buscar novas rotas e passam a explorar severamente a África subsaariana e a América. 

Na virada do século 16 para o 17 os europeus atingem um nível de exploração de recursos naturais do mundo jamais visto antes na história. Os espanhóis levaram quantidades gigantescas de ouro e prata do Império Inca para Europa e acabaram sofrendo pesadas derrotas e saques nas mãos de ingleses (1588) e de neerlandeses (holandeses, por volta de 1628-1630). Em 1621 os neerlandeses criam a primeira companhia de capital aberto, a Western Indian Company (WIC). O discurso liberal começa a ganhar muita força, pois o sistema mercantil centrado nas monarquias se mostrava obsoleto: Havia riqueza para todos os europeus exploradores e colonialistas, então era possível o aparecimento de novos poderes. Com o discurso de supostos representantes do povo, a burguesia começava a conquistar seu espaço. Misturando-se com os conflitos religiosos entre protestantes / calvinistas e católicos, no ano de 1640 os burgueses fazem exigências para a monarquia inglesa que acaba apreendendo o ouro privado. Pouco tempo depois, em 1642 começam os conflitos que acabariam com o assassinato do rei inglês e a instauração da Comunidade ("República") Inglesa em 1649. Obviamente as aristocracias reagem na Europa e em 1660 a monarquia volta ao poder na Inglaterra. Os conflitos eventualmente continuaram e já não tinham nem traços de causas nobres: Notoriamente tornaram-se uma mera disputa de poderes. A exploração de mão de obra escravizada e a quantidade de riquezas extraídas da África e principalmente das Américas poderia ter resolvido todas as solicitações de justiça social e religiosa dos países europeus que originaram a disputa entre católicos e protestantes. Tais conflitos que se consolidaram nas guerras hussitas (1435-1436) e politicamente na "reforma da igreja" (1518-1529), se alastraram pela Europa, transformando-se nestas guerras de interesse econômico do século 17. No final do século 17, discordando dos métodos investigativos do continente europeu (o racionalismo/ pensamento cartesiano, desenvolvido em meados do mesmo século), os britânicos propõem o empirismo como método científico. Talvez tais movimentos discretamente façam parte dessas disputas por poder e influência, mesmo porque alguns destes mesmos britânicos (ingleses) registram e propõem a ideologia liberal. Estava consolidado o liberalismo: Liberdade esta que não libertava os escravos, pois tratava-se só de uma ideologia de classes sociais endinheiradas, resumidamente de burgueses. O frágil equilíbrio entre burguesia, clero e aristocracia acabaria desfazendo-se em mais alguns conflitos de interesses. 

A partir daí, no início do século 18, ocorrem a expansão colonial britânica (que derrota a França absolutista em diversos conflitos pelo globo) e a supressão das missões jesuítas pela aristocracia Luso-espanhola. No final deste século também começava a revolução industrial (motores a vapor etc) e o declínio das monarquias (com a independência dos EUA e a Revolução Francesa). Aí surgem os termos direita e esquerda, conhecidos até hoje: A direita que defendia a liberdade dos comerciantes bem sucedidos (burgueses) apoiada por alguns setores da igreja europeia e a esquerda que pretendia aprofundar a revolução redistribuindo riquezas aos mais pobres. Ainda que os 2 lados tenham cometido erros, ou se corrompido em certos momentos, é interessante lembrar que poucos foram os enriquecidos (essencialmente a direita) que perderam suas fortunas, influências e poderes. Conforme a escravidão foi sendo lentamente abolida nas colônias dos países europeus, classes de trabalhadores pobres foram colocadas em seu lugar e estas tiveram que lutar contra a exploração física, social e até mental. 

Nada disso justifica os mais ricos explorarem os mais pobres e os mais humildes. Na verdade tais fatos só provam que quem tem poder (aqui fica nítido que os maiores poderes do ocidente desde a renascença foram o econômico e o religioso) e não abdica disto, é orgulhoso e/ou egoísta. Egoísta obviamente se trata de essencialmente ganancioso nestes casos. Qualquer um pode notar isso, a menos que negue a realidade. O capitalismo não é uma força da natureza, não "pré-existe" a humanidade e a verdadeira fé cristã não aceita enriquecimento enquanto pessoas vivem na pobreza ou na miséria. 

Grandes fortunas só se justificam (de tornar justo) quando aplicadas em grandes obras humanitárias e principalmente em projetos para o progresso de toda humanidade. Não apenas para uma pequena parcela de humanos enriquecidos. Quem acumula grandes riquezas materiais não é um exemplo de racionalidade, muito menos de empatia (no sentido de ser solidário, que se põe no lugar do outro). Não é a favor do progresso científico nem da verdadeira espiritualidade.