sábado, 29 de outubro de 2022

Pensamentos e sentimentos influenciam o Coletivo?

 

Como nos tornamos uma sociedade que ignora os fatos e a empatia? 
Geralmente entende-se que existem sentimentos bons e ruins com certa facilidade, mas o mesmo não é tão simples assim quando nos referimos aos pensamentos. Embora algumas pessoas possam afirmar que existem pensamentos ruins e bons, se tratando de um tema mais racional, certamente a coisa fica mais complexa: Seria possível um pensamento bom independer de um sentimento bom? E um pensamento ruim independer de um sentimento ruim? 
Eu entendo que eles devem ter algum tipo de ligação entre si (pensamento bom com um sentimento bom e um pensamento ruim com um sentimento ruim), mas talvez um não dependa do outro. Não totalmente. 
Explicarei com alguns exemplos: Pensar (e planejar) a equidade, o progresso e o zelo entre todos seres humanos é bom, mas não requer um sentimento bom direcionado a todos seres humanos, uma vez que tal sentimento se for possível, deve ser algo raro devido a sua grande amplitude. Pensar (e planejar) a equidade, o progresso e o zelo entre todos seres humanos seria o reverso de não pensar (nem planejar) a equidade entre todos seres humanos. Seria também o reverso de tumultuar e propagar destruição e retrocessos. E por fim, ao invés do zelo, teríamos descuidos, boataria e mentiras. 
Tudo isto independe dos sentimentos, ao menos em algum nível, porque os exemplos ruins (negativos) podem ser propagados com uma dose maior de ignorância do que com sentimentos negativos como ódio, intolerância etc. 
Isto significa que quem pensa ou age conforme os exemplos ruins aqui citados são totalmente neutros em suas relações (seja com a comunidade, com a nação ou com a política)? Não. Como eu afirmei em textos anteriores, esse negócio da neutralidade é praticamente inexistente porque pressupõe uma falta de intencionalidade por parte do ser humano, quando na verdade sempre há alguma intenção, seja vaga ou clara... 
Obviamente, se tratando de relações humanas a nível coletivo, o assunto fica mais complexo, pois temos as mídias de massa, as redes sociais com seus influencers, etc etc. Tudo isto influencia na decisão das pessoas... Mas até que nível? Já não sei dizer, mas sei que quanto menos nos esforçamos para pensar e entender nossa sociedade e nosso país, mais manipulados somos. Quanto mais optamos por ver o que é meramente agradável, o que é fácil ou o que está de acordo com tradições, menos pensamos. Quanto mais colocamos a culpa de nossos problemas no passado, menos resolvemos problemas no presente. Quanto mais temos medo de possibilidades futuras, temos menos paz e menos saúde (mental principalmente). Temos a capacidade de pensar e de sentir, assim podemos estudar, checar informações, buscar entender os outros, se colocar no lugar deles etc. Nada disso é realmente novo, pois se trata de manter-se consciente, um assunto que trato (principalmente na conclusão) neste outro texto que escrevi em meados de 2020: https://nea-ekklesia.blogspot.com/2020/02/politica-brasileira-de-2013-2020-um.html
Sim, discorri sobre pensamento e sentimento aqui, para falar de política porque política esbarra em tudo. Ao menos nesta vida material. Já para quem crê em uma vida espiritual, acho difícil a política gerar impactos significativos lá "do outro lado", mas mesmo para espiritualistas e religiosos, a política é uma realidade que afeta seus corpos e mentes. 
Então se tratando de política temos um cenário muito parecido com o da última eleição presidencial (de 2018). De um lado, Luíz Inácio da Silva (Lula), um político voltado um pouco mais as questões sociais, como infraestrutura do país e direitos dos cidadãos. Um cara envolto em casos suspeitos (mensalão, sítio em Atibaia, pedalinho etc) como tantos outros políticos, mas que realiza um mínimo de ações esperadas desta classe. Outras acusações mais atuais contra ele são especulações sobre o que ele fará em seu mandato e fazem parte dos discursos que beneficiam o outro candidato, como mostrarei adiante. Então do outro lado, temos Jair Bolsonaro... Não o clássico político voltado a liberação do mercado, favorecendo principalmente os maiores oligopólios do país... Este é um cara que alegou em rede nacional que os portugueses nunca pisaram na África (nega a história do país), Um cara que fala em fuzilar pessoas de outro partido político. Um cara que defende torturador investigado e condenado. (fez tudo isso publicamente, diante câmeras) Um cara que atrasa compra de vacina em meio a um a pandemia mortal e planeja diversos esquemas fraudulentos durante a mesma pandemia. Um cara que reforça todo discurso de ignorância, imediatismo e ódio com a desculpa de não poder dizer o que pensa, quando na verdade pensa o tempo todo em prejudicar o maior número de pessoas para favorecer a si mesmo e uns poucos aliados. Aliados que reproduziram discursos nazistas, desmataram a Amazônia, sucatearam a FUNAI e a Eletrobrás e outros setores da infraestrutura. Um cara que quer controlar completamente o poder judiciário, destruindo uma das instituições básicas de equilíbrio de poder da república. A lista de atentados e crimes deste candidato a presidência do Brasil é surrealmente grande. Para um candidato que governou só um mandato, as ações reprováveis deste ser, certamente bate os recordes de qualquer outro político que tenha passado pela presidência do Brasil. 
Mas, como um cara desses subiu ao poder? Simples: Pode até ser que as mentiras criminosas (fake news) durante a corrida eleitoral favoreceu o candidato, mas a verdade é que ele representa uma parcela grande da sociedade: Pesquisas feitas entre o 2º semestre de 2020 e o 1º semestre de 2021, que indicavam o período de menor popularidade de Jair, ainda sustentavam cerca de 30% de apoio por parte dos eleitores brasileiros! 
Tais informações são um indício que vivemos em uma civilização que (ainda) alterna entre a histeria movida à boataria (fomentação de rivalidade, orgulho e intolerância) e frieza movida a base de ignorância ou ganância. Isto é evidente fora da política, em setores como o mercado e a religião, por exemplo: 
Trabalhadores não se enxergam como uma classe há anos: Vivemos na era da auto exploração induzida principalmente por empresários de grandes corporações e eventuais empresas de médio porte sob discursos de produtividade e meritocracia; (para mais esclarecimentos sobre este assunto recomendo a leitura do livro "A Sociedade do Cansaço" de Byung Chul Han.) 
Muitos religiosos não desenvolvem espiritualidade alguma: São pessoas manipuladas por líderes religiosos (pastores ou padres conservadores) gananciosos que propagam discursos de intolerância, rivalidade e conseqüentemente espalham medo e ignorância. As religiões cristãs que são dominantes em países americanos como o Brasil, desde meados do século XVI, foram inundadas por sensacionalismo após o desenvolvimento das mídias de massa e digitais. Não se trata de poucos líderes religiosos enriquecidos manipulando as massas como ocorria nas eras medievais e coloniais: Se trata de descaracterizar o próprio cristianismo, distorcendo e abandonando os ensinamentos centrais de amor a Deus (ao Todo) e de amor ao próximo (a todas pessoas). 
 Isto sem contar as classes militares como a polícia e o exército tomados por um número crescente de ações violentas (sem entendimento da sociedade, sem inteligência investigativa e sem capturar os maiores traficantes de produtos ilegais no país), tomados pelo abandono das funções originais (de proteger a maioria da população, que é pobre) por intromissões na política (colaborando com uma política policialesca e com punitivismo). 
Tais discursos e ideologias (meritocrática, fundamentalista e/ou punitivista) são aceitas pelas pessoas porque elas têm algum espaço "na mente". Este espaço pode ser mais intelectual/ racional surgindo como uma forma de desconhecimento (seja por falta de oportunidade de estudo, por opção de estudar pouco ou nada etc), ou pode ser mais "emocional" (referente aos sentimentos) como algum vazio afetivo ou existencial. Na verdade os discursos nocivos podem ser assimilados pelo fato das pessoas terem ambos espaços (desconhecimento e vazios afetivos/ existenciais). 
Eu não tenho uma mensagem mágica que fará as pessoas a se tornarem mais empáticas, estudiosas, colaborativas ou unidas. Mas tenho esperança de que um dia, de alguma forma, nós aprenderemos a importância destas posturas e virtudes como sociedade (seja a nação ou a raça humana de todo planeta). Seja por caminhos com mais sofrimentos ou com menos sofrimentos.