sexta-feira, 30 de setembro de 2022

A Importância do Conteúdo Inconsciente

 

A "Futilização" Inconsciente 
Neste texto faço uma análise dos meus "sonhos" e busco explicá-los sob o olhar de algumas teorias psicológicas, sem me prender a qualquer uma delas.

Daqui um ou dois meses eu completarei 3 anos anotando meus sonhos... Ao menos os que eu me lembro ao acordar. Comecei a fazer isto por questões bem particulares relacionadas a assuntos que considero espirituais, mas neste ano de 2022 gradativamente eu vim percebendo que, em meus sonhos, eu fui lidando cada vez mais com futilidades... Como assim? 
Os sonhos de "teor espiritual" que eu tive eram questões que eu resolvi com auxílio de ensinamentos do espiritismo, da umbanda e principalmente do cristianismo (não, não foi algo relacionado a uma religião, igreja nem congregação específica). Porém, após meses de empenho em me espiritualizar baseando-me principalmente em lições sobre humildade e solidariedade, os sonhos de teor espiritual cujo muitos eram assustadores e terrivelmente incômodos, foram dando espaço a diálogos mentais, na maioria das vezes com assuntos que me parecem comum na vida das pessoas, mas em geral desinteressantes para mim. Estes assuntos geralmente giram em torno de discussões superficiais sobre algum trabalho, sobre alguma ciência, particularmente psicologia que é uma área que eu estudo, ou sobre hobbies relacionados a busca por prazeres dos seres humanos. Esta busca por prazeres a que me refiro, surge em meus sonhos sempre relacionada a pessoas que eu conheço e convivo (ou convivi) com certa frequência: família, colegas da faculdade e às vezes de outros círculos que frequento e frequentei, como grupos do trabalho, do bairro e de hobbies, de "voluntariados" etc. 
Antes de começar a anotar os sonhos no final de 2019, eu ocasionalmente me lembrava de um sonho ou outro, e de fato, os assuntos do cotidiano e de rotina, frequentemente apareciam em meus sonhos de maneira aparentemente entediante, superficial e/ ou fútil. Porém após os eventos que me fizeram realizar minhas "anotações oníricas" e buscar uma espiritualidade, os sonhos se tornaram muito vívidos. Mais vívidos do que qualquer sonho vívido que eu tive antes do ano de 2016, ou seja, mais do que qualquer sonho que eu tive em 35 anos de vida no velho planeta Terra. Às vezes o termo vívido me parece impreciso para explicar estas experiências "oníricas", pois muitos destes sonhos a que me refiro parecem mais reais do que meu período de vigília (acordado) na Terra. Mais reais porque não existe o filtro do corpo de fato: Parece que minha essência (alma ou mente) interage diretamente com outras mentes e que toda manifestação sensorial dos sonhos (imagens, sons etc) é um mero cenário ocultando uma vastidão de elementos psíquicos meus e dos outros com quem interajo. É quase uma realidade a parte, mas não completamente separada, pois é conectada com meu período de vigília, através das experiências que geram aprendizado, através das reações emocionais etc. Mas porque tudo, ou quase tudo, em meus sonhos parece estar se tornando fútil? Acho que não é uma pergunta difícil: a resposta é que a maioria das pessoas gosta de ser fútil (certamente eu me incluo entre estas pessoas com alguma frequência). 
Em nossa atual sociedade pós moderna, existem inúmeras maneiras de ser fútil, afinal com o desenvolvimento das mídias de massa (rádio, tv etc), da internet, da indústria de entretenimento (cinema, jogos eletrônicos, streaming, netflix etc) e com a propagação da comercialização de produtos psicoativos legalizados (bebidas alcoólicas e cigarro), as maneiras de ser fútil se multiplicaram como nunca visto antes nos 5.500 anos de história escrita da humanidade. Independentemente se meus sonhos são apenas reflexões da vida consciente ou se apresentam aspectos de uma existência que transcende o corpo, estes conteúdos fúteis me mostraram a profundidade que eles podem alcançar na mente humana. 
Na psicologia, alguns autores da linha psicanálitica (Freud, Lacan, Klein, Winnicott, Jung entre outros) indicaram o quanto o ser humano pode enganar a si mesmo (ou tentar), escondendo conteúdos incômodos, ou difíceis de lidar em seu inconsciente. Isto ocorre porque nenhuma memória ou sentimento deixa de existir repentinamente podendo ressurgir do nada algum tempo depois. Nossos sentimentos continuam existindo e podemos fingir que não os temos ou podemos lidar com eles, seja um sentimento "bom ou ruim" e o mesmo fenômeno ocorre com nossas memórias. 

 Mas os conteúdos fúteis deveriam predominar em nosso inconsciente? Se isto acontecer com a maioria das pessoas, não seria um sinal que há algo errado com a humanidade? 
Os conteúdos que parecem me cercar de fato são assuntos que as pessoas falam o tempo todo: de trabalhos rotineiros, estudos superficiais, hobbies/ passatempos e prazeres sensoriais relacionados às bebidas e comidas. Mais raramente falam sobre prazeres de teor sexual porque isto ainda é tabu em nossa sociedade. Todos estes assuntos também me cercam em meus sonhos, mas conforme fui me dedicando à espiritualidade, foi ficando mais nítido que estes conteúdos eram cada vez mais externos, ou seja, são cada vez menos meus, parecendo conteúdos de outras mentes as quais eu escuto e indago em meus sonhos. A atividade/ interação vívida durante meu sono que mencionei anteriormente. 
Independentemente se são meus ou não, estes conteúdos no inconsciente não mostraria uma priorização crescente do que é superficial? Ou seja, uma priorização do que não tem profundidade nem racional nem sentimental... ? Tais conteúdos deveriam ser um mero passatempo, algumas pausas para descanso ou talvez um "ócio criativo", mas não algo que nos guie, muito menos que nos inspire porque eles sequer trazem algum tipo de esperança. 

 Assim, eu vejo clara proximidade destes fenômenos inconscientes com o adoecimento de nossa sociedade. Se não buscamos nem valorizamos os bons sentimentos mais profundos e/ ou mais vastos, quais serão as consequências disto para a sociedade humana? 
Se todos interagimos uns com os outros e regularmente não só no lazer, mas no trabalho, nos estudos e dentro de um sistema econômico e social-político, significa que precisamos uns dos outros como seres humanos inseridos em uma comunidade ou civilização - Significa que cada ser humano é um sistema com pensamentos, memórias, opiniões, sentimentos que se expressam no diálogo, no lidar, no aprender e nas emoções que afetam o próximo. Significa que nós como sistemas racionais e sentimentais, quando interagimos uns com os outros e quando colaboramos com a comunidade ou nação em que vivemos, formamos sistemas sociais, ou seja nossa sociedade, que vão desde grupos de amigos, famílias, colegas de estudos e de trabalho até cidadãos, membros de um estado e de uma nação. O que será de nós ao priorizarmos discussões superficiais ou fúteis em nossas vidas? O que será de nós se ninguém prioriza uma empatia solidária? Será que ao priorizarmos a superficialidade no trabalho, nos estudos e no lazer, não perderemos a tolerância uns com os outros? Será que não vamos dar as costas aos necessitados? Será que não vamos começar a acreditar em qualquer acusação ou boato que surgir em nossa frente? 
O neuropsiquiatra fundador da logoterapia, Viktor Frankl, estudou a importância do sentido de vida nas pessoas. Não vou detalhar a teoria de Frankl neste texto, mas para quem ainda não conhece, recomendo o livro Em Busca de Sentido. 
Enfim, este sentido de vida pode (e deve) orientar o ser humano para além de si mesmo, ou seja, para um sentimento dedicado às pessoas amadas, para uma tarefa que sirva às outras pessoas ou para uma espiritualidade/ fé em algo maior, algo que nos dê esperança e certamente possa propagar esta esperança. Afinal o ser humano não existe para si mesmo individualmente - ele é um ser social, que apesar dos conflitos, aprende a colaborar com o próximo, evoluindo e esta evolução requer tolerância entre indivíduos e grupos e uma busca por desenvolvimento racional e emocional. Esta busca deve nos orientar, ou seja, precisa se tornar nossa prioridade. É ela que deveria predominar nosso inconsciente (ao menos em algum ponto de nossas vidas) e nos guiar como seres humanos, cultivando o se importar não só com os pequenos círculos sociais (família e amigos) mas também com os grandes círculos sociais (as comunidade, a sociedade, a civilização humana). Se nos deixarmos levar pela superficialidade em todas estas interações, nos tornaremos facilmente manipuláveis e insensíveis. Afinal uma mente superficial é mais facilmente manipulável e uma mente que ignora o sofrimento em seu entorno, e as dificuldades de sua realidade, torna-se insensível. Uma combinação que ao dominar a maioria das pessoas de uma sociedade, pode trazer consequências muito nocivas em larga escala. 
A busca pelo desenvolvimento racional/ intelectual e emocional/ sentimental não é algo utópico ou dificílimo de se praticar - Trata-se de ser humilde, assumindo que temos muito a aprender e que podemos aprender. É assim que abandonamos tanto as atitudes superficiais e fúteis, como as posturas e atitudes nocivas ao próximo e a nós mesmos - Esta busca por desenvolvimento nos âmbitos mais racionais e mais sentimentais é semelhante à proposta de Viktor Frankl (a busca por sentido) e é um modo de desenvolvermos uma capacidade de aprender aliada a uma empatia solidária...